Luz
e sombra são antagônicas, mas somos paradoxais e feitos de
ambas.
Uma
canção, um filme, um poema, sombrios, que revelem desencanto,
tristeza, revolta, perplexidades, cabem no espaço da nossa reflexão.
São mesmo, eu diria, desdobramentos indiretos dos nossos idealismos.
Como exaltar a luz sem conhecer as escuridões da alma humana?
Não
sou dos que pensam a poesia como simples escapismo alienante.
Sinto-me à vontade para dizer isso, porque “me canso” de cantar
as belezas em versos, é a porção maior da minha produção. Mas
não me furto à expressão das minhas angústias, estupefações,
conflitos.
Explode
o homem-bomba
É
dos homens? Do seu Deus?
Do
deus-si que zomba?
A
arte não seria a mesma sem um Guernica de Picasso, libelo contra a
Guerra Civil espanhola, Sem um Flores do Mal, de Baudelaire ou um Eu
profundo e outros eus, de Augusto dos Anjos e até um Blade Runner,
de Ridley Scott, que retrata um futuro sombrio e paranoico. O androide, morrendo, narra as maravilhas do Homem e conclui: "como lágrimas na chuva."
Até
porque, alguém já disse que tem beleza na tristeza. Isso está
impregnado em nós e não há como nem porque esconder, omitir isso
dos outros e de nós mesmos.
Degredo
(Finis Terra)
Longos
corredores com pesadas portas
Frios,
poeirentos, mal iluminados
Sonhos
demolidos num rolar de dados
Vastos
aposentos de princesas mortas
Tochas,
cadafalsos, grades e grilhões
Voz
que reverbera em todo o ermitério
Muitas
pistas falsas velam o mistério
Risco
de iminente embate com dragões
Portas
arrombadas que vão dar em muros
Ponte
levadiça, fosso de miasmas
Lua
que revela o seu semblante escuro
Torres
gigantescas, feudos de fantasmas
Vidro
que se rende ao diamante duro
Frasco
que se parte e entorna todo o plasma