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sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Per-mito-me o pri-mitivo


Escrever com uma visão pseudocientífica, para além da irreverência de ideias e palavras, faz referência ao primitivismo humano, à visão mais pura e “pagã” da vida, da Natureza e do Universo, em contraponto com um contemporâneo e mais massivo cientificismo cartesiano. 

Mas um primitivismo revisitado por um ser pensante e que lança um olhar para os mitos e o encantamento que eles carregam e dos quais de forma paulatina nossa civilização racionalmente foi se afastando. 

Pela via do lúdico, procuro essa desconstrução do apolíneo pelo dionisíaco, pequenas provocações conceituais semânticas. Uns despudores que me per-mito.



                                                                                                                  Litogravura de Ana Eliza Frazão


quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Manancial de Barros


E nosso tão amado Manoel feito do barro das estrelas se foi. É óbvio o nosso pesar, mas que seja igualmente óbvio nosso contentamento e gratidão pelo privilégio de ter um artista tão sensível e original, falante da nossa língua. Fomos presenteados – espero que o mundo todo, com as traduções – por muita beleza. Que nosso pranto pela grande perda seja coadjuvado por um sorriso como os tantos sorrisos que o mestre exibia no rosto.

Há pouco mais de um ano, escrevi um poema em homenagem a ele e por um capricho do acaso, através de uma amiga, fi-lo chegar a Martha, filha do grande poeta. Ela o leu para ele, que sorriu enquanto o ouvia. Um momento muito comovente pra mim e que nunca vou esquecer.


Nosso heroi morreu de overdose de poesia, emoção e beleza e continuará, adulto menino e gênio que foi, pra sempre nos inspirando a viver.

“Escrever nem uma coisa nem outra -
A fim de dizer todas -
Ou, pelo menos, nenhumas.
Assim,
Ao poeta faz bem
Desexplicar -
Tanto quanto escurecer acende os vaga-lumes.”

“Quando as aves falam com as pedras e as rãs com as águas - é de poesia que estão falando.”

“Poesia é voar fora da asa.”

“Tudo que eu não invento é falso”

                  Manoel de Barros


Nosso menestrel, homem que nunca deixou o menino que o habita desde menino mesmo, ir-se com o tempo, deixar de sê-lo, escreveu seu primeiro poema aos 19 anos e publicou o primeiro livro aos 21, com a ajuda de amigos, que artesanalmente produziram 21 exemplares, um dos quais ficou com o próprio autor.

E só seis décadas depois,  já com 81 anos, foi nacionalmente reconhecido ao ser agraciado com o Prêmio Nestlé de Literatura em 1997!

Mas desde cedo, Manoel garimpa e molda suas invenções, com seus modos peculiares de falar das coisas da Natureza, pássaro, flor, árvore, rio, simplicidades da vida, com desconcertante originalidade. Pássaro canoro gorjeando sobre seus iguais. Flor pantaneira exalando poesia de puro encantamento.

Seus sublimes desatinos, que brotam da pena e dos poros, nos extraem sorrisos, nos renovam, enquanto ele reinventa tanto a Natureza quanto a poesia com ideias e imagens que parecem um manancial interminável.

A auspiciosa novidade é que ele será um dos indicados brasileiros ao Prêmio Nobel de Literatura, jamais entregue a um escritor do nosso país.

Mas mesmo que ele não seja o premiado, nós, que amamos a pessoa e o poeta vamos seguir premiando-o da forma despojada que ele preza, espalhando sua poesia por aí.

(Vejam o belo documentário sobre Manoel, chamado Só dez por cento é mentira. Vale a pena e se encontra nas locadoras.)