Importante

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sexta-feira, 27 de abril de 2018

Paz no cais




Neste planeta bonito habita um povo esquisito de heróis, anti-heróis, escassa elite e numerosa plebe rude sem horizonte nem saúde desde tresontonte. O planeta água tem suas fúrias mas sem mágoas nem incúrias. Já o planeta homo sapiens, que é um mundo paralelo dando uma de Elo Perdido, explora sem dó nem si sustenido a terra e a água e a si próprio,  mundo e lei do cão, religião como ópio e opressão. E de explosão em explosão a alma sofre erosão. Em busca de redenção, o que nos traz esperança sem chegar a encher a pança é que temos artistas, cientistas, ativistas, psicanalistas, jornalistas, humanistas, médicos sem fronteiras, rezadeiras, enfermeiras, preservadores da Natureza e da beleza na ativa tentativa de unificar harmonizar Natura e Cultura. Banir a arrogância, a intolerância, os preconceitos, as desigualdades com a suavidade de um Ghandi, aquele pequeno grande homem grande alma Mahatma da Índia. Rendamo-nos, não às armas, mas à empatia e à compaixão. Fundamos e fundemos racionalidade com emoção. Tudo tem um fim, é assim, mas transformemos nossos meios em esteios e remos pra nossa nau singrar em paz até chegar ao cais.

                                             


sábado, 21 de abril de 2018

Consumir consumar



"A cultura do consumo, cultura do efêmero, condena tudo ao desuso mediático. Tudo muda ao ritmo vertiginoso da moda, posta ao serviço da necessidade de vender. As coisas envelhecem num piscar de olhos, para serem substituídas por outras coisas de vida fugaz. Hoje a única coisa que permanece é a insegurança, as mercadorias, fabricadas para não durar, resultam ser voláteis como o capital que as financia e o trabalho que as gera.

O dinheiro voa à velocidade da luz: ontem estava ali, hoje está aqui, amanhã, quem sabe, e todo trabalhador é um desempregado em potencial. Paradoxalmente, os shopping centers, reinos do fugaz, oferecem com o máximo êxito a ilusão da segurança. Eles resistem fora do tempo, sem idade e sem raiz, sem noite e sem dia e sem memória, e existem fora do espaço, para além das turbulências da perigosa realidade do mundo.

Os donos do mundo usam o mundo como se fosse descartável: uma mercadoria de vida efêmera que se esgota como esgotam, pouco depois de nascer, as imagens que dispara a metralhadora da televisão e as modas e os ídolos que a publicidade lança, sem tréguas, no mercado. Mas a que outro mundo vamos nos mudar? Estamos todos obrigados a acreditar no conto de que Deus vendeu o planeta a umas quantas empresas, porque estando de mau humor decidiu privatizar o universo?

A sociedade de consumo é uma armadilha caça-bobos. Os que têm a alavanca simulam ignorá-lo, mas qualquer um que tenha olhos na cara pode ver que a grande maioria das pessoas consome pouco, pouquinho e nada, necessariamente, para garantir a existência da pouca natureza que nos resta.
A injustiça social não é um erro a corrigir, nem um defeito a superar: é uma necessidade essencial. Não há natureza capaz de alimentar um shopping center do tamanho do planeta."

*Eduardo Galeano, falecido em abril de 2015, considerado um dos principais escritores e pensadores políticos da América Latina do último século.


Injústria



Seres analógicos
Em mundo digital
Só digitais impressões
Seremos não mais
que teses de robôs antropomórficos
Perdidos os instintos
Vamos  ser extintos
num fatal labirinto
de eficácia industrial
Motor voraz
Extintor que faz
a vida banal



sábado, 14 de abril de 2018

Sono breve e perene



O sono é um exercício do precipício da morte praticando quando do evento da ditadura da morte não será tão dura e má sorte e cessar a respiração virá com aceitação dormir é morte leve e breve da qual se ressuscita e é mais bonita a manhã seguinte que a noite anterior quando o terror da insônia não detinha o pensar dormir é sonhar despensar e dispensar os tormentos o sono é teu momento exclusivo sem crivos tua redoma teu coma teu descanso dos ranços da rotina tua piscina de mel teu céu na terra sem guerra e cheio de paz um dia em que você pensou que dormia e não acorda mais

                                         
                                            

sábado, 7 de abril de 2018

De deuses e homens




















                                                                                                           ilustração de Ana Eliza Frazão


Em tempos do modismo dos reality shows na TV e dessa mesmice previsível de tediosa mediocridade da fórmula levada à exaustão, me ocorre que um bem mais interessante, talvez o único, teria como participantes os deuses do Olimpo.

Nada poderia ser mais representativo do humano que esse time. Lá no panteão grego, mais mítico que místico, todas as figuras arquetípicas do homem estão presentes: vícios, virtudes, perfídia, inveja, coragem, ambição, raiva, vingança, amor. Reflexo nosso e com o qual todos em alguma medida nos identificamos. E com uma consistência inspiradora. Só Zeus teria de ficar de fora, porque senão seria como o Barcelona versus o Íbis de Pernambuco, vencedor fácil já conhecido desde o início do jogo.

Deuses da perfeição, infalíveis e implacáveis, nos esmagam, oprimem, angustiam, nos fazem infelizes. Os deuses gregos nos educam, talvez, digamos, de uma forma mais Dionísio que Apolo, mais montessoriana que autoritária e severa.

E nesse BBB mythológico, acho que torceria pra Baco, o deus do vinho e pra Afrodite, a deusa do amor.  
  

                                                             

Despertando

O deus está só, assim 
Nem o vinho lhe traz paz
Imortal, vive demais
Condenado a não ter fim

Uma estrela nasce agora
Outras, prestes a apagar
Eras feito meras horas
Dói sem dor cada acordar 

Sem volúpias, sem urgências
Poder tudo e nada ser
Seus prodígios e ciências
Trazendo um quase prazer

Quisera ser bem mortal
No sangue sentir sabor
Chorar e rir por amor
Viver o essencial 

Querer, sem poder, morrer
Sua sina não querida
Sonho vão de eterna vida
com a vida que iria ter

Foi súbito o despertar
Mortal se viu de repente
Com gosto e cheiro de gente
 Sonhou ou está a sonhar?